Midiatização, polarização e intolerância (entre ambientes, meios e circulações)

Trajetórias do coronavírus e interpenetrações de discursos sociais 227 dos pelos atores sociais, enquanto integrantes de coletivos que constituem o amplo tecido social. Não tendo sido objeto deste trabalho, vale, contudo, lembrar que falas que emergem dos ato- res sociais afloraram em alguns discursos que são produzidos por enunciações de outros sistemas, conforme aqui analisados. Elas são recuperadas pelos processos observacionais a partir da extração de enunciações de discursos proferidos pelos diferentes sistemas e dos quais recuperamos a ‘ascensão tenta- tiva’ da fala de atores sociais. Esta aparece na arquitetura inter- penetrante de discursos sobre o coronavírus, particularmente aqueles enunciados pelo sistema político. Em algum momento, ele trata os atores sociais como coletivos não especificados, a quem remete discursos argumentativos visando persuadi-los, etc. Noutros, nomeia-os como ‘fiscais do presidente’ exortan - do-os para ações de inspeção dos serviços de saúde, como hos- pitais. Porém, são palavras de exortação, cujas alocuções não abrem espaço para acolher, enquanto escuta, demandas e pedi- dos vindos da própria voz dos atores. Se o corona faz suas trajetórias “rastreadas” pelos dis- cursos sociais, trajetórias de discursos são afetadas por embates institucionais, simbólicos, etc., mas também por disrupções de caráter interacional, circunstâncias em que manifestam regis- tros sobre recusas da sociedade em desenvolver caminhadas em convergência com as lógicas e ótica do ‘discurso de comba- te’. Uma voz-tentativa emerge no âmbito do dispositivo no qual apenas seguidores teriam acesso ao presidente, para um ritual de cumprimento e de saudação ao comandante. Escapando da vigilância do “Cercadinho do Palácio”, uma ex-militante de movi- mento bolsonarista busca o contato face a face com o presidente e, perante o espanto de seguranças e admiradores, dirige-lhe a mensagem: “Eu estou aqui fazendo cartazinhos só com núme- ros para o senhor ver. Por que não são 38 mil de estatísticas, são 38 mil famílias que estão morrendo nesse momento. São 38 mil pessoas que estão chorando, diz a mulher. Eu vim aqui de todo coração. Eu sinto que o senhor traiu a população. A popu- lação morrendo e o senhor me ignorando. [...]” (YouTubenoti- cias, 10/06/2020). Guardando distância da mulher, o presidente sinaliza a tensão produzida pela natureza do contato enquanto acontecimento distinto das efemérides de saudações dos segui-

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