Para não dizer que não falei das nuvens 115 ainda depende da expropriação de terras e corpos considerados “primitivos” e não humanos pela visão hegemônica (Couldry e Mejías, 2017). Isso também se aplica a territórios acadêmicos, como o emergente campo transdisciplinar da arqueologia das mídias, ou a pesquisadores latino-americanos de territórios não hege- mônicos que trabalham com outras epistemologias e descolonizam a academia por dentro. Segundo Estrada e Lehuédé (2022), essa perspectiva já deveria ser um ponto de partida para pes- quisadores latino-americanos, considerando que grande parte do extrativismo e expropriação que sustentam o complexo da Internet ocorre em seus territórios. 6. Internet Nullius Os aspectos comunicacionais, midiáticos, socioambientais e políticos desses territórios, e dos “outros” que os habitam representam uma mudança significativa. Ao tornar visíveis as contradições entre os imaginários hegemônicos e as imaginações políticas mais terrestres, podemos começar a conceber uma cons- ciência planetária e uma cosmologia alinhada com as urgências da justiça social, ambiental e de dados. Isso exige uma nova posição de escuta, o acesso a outras cosmologias além das ocidentais, a criação de novas linguagens e a proposição de ações efetivas. O resultado é o imaginário de uma Internet terrestre (Estrada e Lehuédé, 2022), telúrica, que difere do imaginário baseado no progresso industrial ou na virtualidade das plata- formas criadas pelos “anjos tronchos” do Vale do Silício. Aqui, podemos pensar em um imaginário sociotécnico que nos dá um sentido de vida – uma espécie de buen vivir digital. Esse imagi- nário ecoa o chamado de Latour (2018) para reconhecer o terrestre como um agente ativo, e não como mero pano de fundo da história e da política. Além disso, vai além da ideia da Terra como uma unidade planetária composta por dois tipos de espaços: o global e o local (Latour, 2014; 2018; Latour e Weibel, 2020). Ambos são clichês utilizados em discursos sobre globa- lização, que favorecem a expansão dos mercados às custas das fronteiras políticas. Para Latour, a política terrestre rompe com
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