À imagem e semelhança: máquina, homem e imaginários em circulação 239 conotações diversas como a sexualização. Além disso, há tensionamentos sobre a apropriação da criação de estilos de artistas digitais, bem como das próprias imagens concedidas pelos usuá- rios. A discussão de um imaginário racializado da inteligência artificial é ampla, a exemplo de trabalhos como de Cave e Dihal (2020), que problematizam tanto as imagens geradas por AI como os imaginários mobilizados. Entram nesta reflexão tanto os avatares criados para nossa interação, como a Lu da Magalu, quanto os padrões de filtros para Instagram selecionados como modelos de um ideal. Assim, a estrutura social racial que define atributos passa a intensificar os apagamentos das diferenças no ambiente digital tanto ou mais do que no ambiente físico das ruas e cidades. Estes casos trazem à tona múltiplas questões que não cabem neste texto. No entanto, podem indicar um ponto impor- tante sobre os estigmas e estereótipos da máquina. Quando pensamos que o imaginário da máquina é discriminatório, podemos pensar nos sentidos agenciados nesse jogo de imaginações: o homem que imagina a máquina, a máquina que imagina o homem e o imaginário social em coprodução. Flusser já salienta- va que não se trata da dualidade homem-máquina, mas da sua articulação. 7. Como imaginar um devir? Pensar em um devir, no duplo sentido da palavra – tanto como vir a ser quanto um fluxo permanente –. nos permite retomar a provocação que está no título deste trabalho a respei- to da ideia bíblica da imagem e semelhança. Dietmar Kamper (2001), em interessante ensaio intitulado “As máquinas são tão mortais quanto os homens”, a partir de uma frase proferida por Friedrich Kittler, traça uma analogia entre Deus, o homem e a máquina considerando o lugar de quem sonha. Para o autor, os meios de comunicação, em especial os digitais, realizaram o so- nho de estar em toda parte, o que exige uma espécie de descorporeidade. Perder o corpo implica fazer-se imagem, adquirindo nela um duplo. Mas, como bem salienta o autor, “Servir-se das máquinas-telas é esquecer que as coisas e os corpos são atingí-
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