Lucrécia D’Alessio Ferrara 324 9. Midiatização como tecnoimunização Imunização e mídia são conceitos que a modernidade contemporânea aproximou e parece ter vinculado. Se, enquanto biologia, saúde e política, a imunização é contraditória; a mídia, enquanto mediação, não é diferente: nos dois casos temos uma contradição que nos obriga a trabalhar na tangência dos dois conceitos, a fim de ser possível apreender, nas respectivas fron- teiras, a possibilidade de encontrar saídas que nos possibilitem ir além daquela marca contraditória, que nos impediria de pen- sar e refletir. Enquanto poder de conservação da vida, a imunização apresenta quatro categorias básicas: a própria imunização que, contraditória, conserva a saúde expondo-a ao germe da doença; a soberania que, ao mesmo tempo que protege o sujeito, o submete ao poder; a propriedade que assegura a posse de um bem, alienando o sujeito das suas possibilidades de encontrar alter- nativas comuns ao coletivo; a liberdade que, enfatizando o caráter contraditório, transforma a imunização em dispositivo que priva o sujeito de decisão dos caminhos a escolher, conforme sua própria vontade. Mais do que nunca, o homem surge submisso a uma seleção que, embora tenha um caráter econômico e social, é igualmente implacável e pode excluí-lo da sua capacidade de decisão (Esposito, 2006, p. 73 e segs.). Em paralelo, mas concentrados na análise da mídia, podemos observar que a tecnologia midiática em todas as suas proposições, mas sobretudo em relação ao digital, se apresenta igualmente contraditória porque, se imuniza o sujeito, o subme- te ao seu jugo de tempo, espaço, entretenimento e opções sele- tivas. Nesse sutil jogo que parece defender o usuário dando-lhe o melhor emprego para sua capacidade criativa, o submete, ao mesmo tempo, a uma restrição que não lhe permite simples- mente usufruir, pois lhe impõe um letramento, um saber fazer, para poder utilizar a mídia e tornar-se midiático, para si mesmo e para os outros. A mídia oferece liberdade de escolha, desde que sejamos submissos às possibilidades de um programa apresentado como menu que se oferece, mas se impõe como única escolha. Enquanto imunização, a mídia não é apenas contraditó-
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