José Luiz Braga 338 d) Composições simplificadoras e conformadoras da diversidade O algoritmo não apenas reforça preferências – mas, para cada usuário, faz a seleção das que favorecem uma articu- lação com padrões de grupo, sem que o usuário se aperceba das categorias grupais em que está sendo inscrito. Ou seja: o algoritmo gera um nicho não conscientemente escolhido, e nem mes- mo percebido pelo usuário, mas ao qual ele vai ser ajustado e conforma A d s o. interações humanas fortemente organizadas a partir de algoritmos automatizados tendem, devido a essa mesma automatização, a serem exercidas de modo pouco flexível, difi- cultando sua permeação com composições vizinhas. Creio que isso define razoavelmente o que é uma “formação de bolhas”. O risco de bolhas sociais é também duplo: tornam-se impermeá- veis ao entorno e promovem uma forte redução da diversidade interna do grupo. Os receios que durante certo tempo no século XX se co- locavam em decorrência da predominância televisual sobre a escrita parece terem se invertido. Naquele tempo, receava-se que, dada a pregnância dos canais de televisão – pouco diversifica- dos e com grande abrangência de atingimento –, levassem a uma predominância generalizada de pensamento único, associado a uma visão superficial das coisas – toda a sociedade alegremente fútil e irresponsável3, em uníssono preocupante. Agora, inversamente, não temos mais nem o risco de pensamento único nemmesmo o da percepção flutuante da futi- lidade. Os habitantes de bolhas virtuais, em adesão cega e intensa às posturas de sua “realidade à parte”, geram uma dispersão radical, incapazes de ação conjunta e mesmo de simples debate ponderado com setores e ideias “externos”, para objetivos sociais amplos que os levassem à construção de uma realidade so- cial complexa e asseguradora de efetiva diversidade composta. Sem essa busca de composições da diversidade, o que temos é 3 Inevitavelmente relembramos a sarcástica e feroz música de Tom Zé, dos anos 60 – “a felicidade vai se espalhar sobre os homens”; e, no mesmo período, o filme Fahrenheit 451, dirigido por François Truffaut.
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