Ada C. Machado da Silveira 70 Os apelos do chamado bolsonarismo coincidiram com práticas assentadas da cobertura noticiosa, dentre as quais so- bressai o populismo penal, uma prática política embasada na proposição para a segurança pública de uma política criminal e de soluções que não estão apoiadas em evidências empíricas ou nas opiniões de especialistas. Igualmente, apelos ao pânico mo- ral ameaçam a sociedade e seus valores, expondo determinados indivíduos ou grupos estereotipados. A operação discursiva que conduziu o direcionamen- to do Jornal Nacional às narrativas do medo e exacerbação do sentimento de insegurança da população nos 15 dias que ante- cederam à Intervenção Federal no Rio de Janeiro, em 2018, pode ser um exemplo de reação ao conflito estabelecido na noticiabilidade (Schneider, 2023). A implementação da política do medo na cobertura jornalística induziu à percepção social quanto à necessidade de medidas de urgência em favor da legitimação de respostas governamentais coercitivas e que são adotadas em de- trimento de outras. Anteriormente ao acontecimento referido no Rio de Janeiro, o jornal O Globo, do mesmo grupo midiático, ao desen- volver sua cobertura sobre as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) entre os anos de 2008 e 2016, incrementou sua atenção a temas relacionados à criminalidade e violência, em detrimen- to de outros. Análise de Pereira (2020, p. 383) verificou que “a cobertura atuou na legitimação discursiva das UPPs, no sentido de que realçou os seus pontos positivos, obscureceu os negati- vos e privilegiou declarações de agentes do Estado, justificando assim, para o seu público, os seus efeitos adversos”. Em anos posteriores, a erosão democrática no perío- do da presidência de Jair Bolsonaro apontaria para o caminho da autocratização, um fenômeno emergente em nível mundial. A queda substantiva de atributos democráticos ocorre através de estratégias como tentativas de controle político-ideológico, revisionismo histórico-científico, ataques à liberdade acadêmica, bem como a associações civis e às organizações não gover- namentais (ONGs), além da incitação ao pânico moral. O pânico moral de fonte informacional incide sobre as diversas práticas de desinformação. O cotidiano dos brasileiros, permeado por inseguranças físicas, financeiras e políticas, alimentado por in-
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