Plataformas, algoritmos e IA: questões e hipóteses na perspectiva da midiatização

Aline Roes Dalmolin 88 Neste processo de agendamento reativo, cabe destacar que boa parte das informações disseminadas se trata de conteú- do desinformativo. Um exemplo disso no campo da extrema-di- reita foi a campanha de difamação do processo eleitoral brasileiro, impulsionada meses antes das eleições, bastante similar ao processo ocorrido durante as últimas eleições norte-america- nas. Durante meses, circulou intensamente na midiosfera bolsonarista uma verdadeira campanha de desmoralização das urnas eletrônicas e das instituições do Poder Judiciário responsáveis pela condução e fiscalização do processo eleitoral brasileiro. Fake news não correspondem à simples midia- tização de boatos, de imprecisões factuais e de mentiras. São processos orquestrados em função de estruturas polarizadoras. O objetivo é duplo: demarcar o adversário como mostrando um perfil abaixo da dignidade humana; e no mesmo passo, com base nessa distinção radical, fazer pretendi- dos aliados esquecerem as diferenças que pode- riam entreter com o polo disseminador de fake news (Braga, 2020, p. 311). A desqualificação do adversário aludida por Braga (2020) no trecho acima pode ser aproximada daquilo que cha- mamos de ódio biopolítico (Dalmolin, 2020), a expressão nas redes sociais que visa a reduzir o outro a sua condição biológica, reduzindo-o a sua condição de gênero, raça, cor, etc. O ódio biopolítico tem a intenção de afetar os aspectos eminentemente biológicos dos sujeitos envolvidos: a cor de sua pele, seu caráter de gênero, a natureza de suas práticas sexuais, ou seja, suas di- vergências de um padrão considerado correto por aquele grupo em questão. A ação do ódio biopolítico não deixa margem para dúvidas, pluralidade e divergência: aquele de quem discordo deve ser silenciado, rejeitado ou eliminado. Esse maquinário do ódio age não apenas através daquilo que ele tem para dizer, mas também por estratégias de silenciamento e medo. No campo da midiosfera bolsonarista, a expressão do ódio biopolítico pode agregar tons biológicos, mas o alvo principal é o “petismo”/”esquerdismo”, ou seja, a suposta simpatia ou filiação a um partido tratada como se fosse uma raça a ser des-

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