Redes, sociedade e pólis: recortes epistemológicos na midiatização

Rita Figueiras 130 O comentário chegou à televisão portuguesa em 2000 com a contratação de Marcelo Rebelo de Sousa para comentador do noticiário principal da estação privada TVI, onde permane- ceu até outubro de 2015, pouco tempo antes de começar a sua campanha para a presidência da República. Marcelo era conhe- cido apenas entre as elites nacionais quando iniciou os comentá- rios na televisão, mas após 16 anos a falar diretamente aos por- tugueses durante quase 1 hora por semana, Marcelo tornou-se a figura mais popular do país e, em janeiro de 2016, foi eleito presidente da República à primeira volta numa eleição disputa- da entre 10 candidatos. A entrada do comentário num noticiário popular e de elevada audiência, como o da TVI, democratizou o acesso à opi- nião esclarecida e massificou o consumo de um produto de elite até então apenas disponível na imprensa de referência e con- sumida pela elite nacional (FIGUEIRAS, 2009; 2011). Marcelo trouxe ainda um novo perfil de audiências para o espaço infor - mativo, com os outros media a darem eco das suas opiniões e o noticiário da TVI a ganhar o estatuto de agenda-setter de outros meios de comunicação, de jornalistas de referência e das esferas de poder em Portugal. A contratação de Rebelo de Sousa pela TVI colocou a figura do comentador na sociedade portuguesa num patamar totalmente novo. O “fenómeno Marcelo” é, assim, fundamental para compreender por que é que o comentário em Portugal se tornou uma componente estruturante das emissões dos canais de televisão no novo milénio, ao mesmo tempo que consolidou o comentário como um espaço de poder. Como interface do e de poder, a esfera do comentário é, assim, um lugar privilegiado de análise de uma das instâncias que é, simultaneamente, central na formação da opinião pública e na representação das esferas de poder em Portugal. Este artigo foca-se no espaço de comentário, e nos co- mentadores, nos noticiários do horário nobre dos canais de tele- visão generalistas e por cabo em Portugal, entre 2000 e 2015. O estudo perspetiva o comentário como um indicador da relação entre os media e a política e utiliza o conceito de mediatização da política para guiar a pesquisa empírica. Adotar este construto como uma ferramenta analítica não significa ignorar o debate

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