Redes, sociedade e pólis: recortes epistemológicos na midiatização

Prefácio 15 regime capitalista; há vários campos profissionais da comuni - cação, com capital social específico e rotinas produtivas e deon - tologias próprias; há várias lógicas (ou gramáticas ou qualquer outra expressão que denote modos sistemáticos, modelos testa - dos e padrões ensinados e aprendidos de produção de sentido) em funcionamento nos campos da comunicação. Mas a comu- nicação enquanto fato social, enquanto sentidos deslizando de emissores a receptores, enquanto fluxos de “conteúdos” – para usar esta denominação em voga no ambiente digital –, é política, é cultura, é entretenimento, é sociabilidade, é comércio. Comunicação política, por exemplo, não é a combinação de política e comunicação, é a comunicação na qual viaja con- teúdo político, na qual o conteúdo político é gerado, disputado, transformado em arma, em frames , em agendas, em informação, em fake news , em esclarecimento, em teorias da conspiração, em relatos de fatos e em enganos e manipulações. Não tem como de- sentranhar a comunicação e a política na comunicação política, como provavelmente não haverá meio de fazer uma diálise entre comunicação e sociabilidade ou cultura. De forma que, se a mediatização for justamente a con- dição que cria um fenômeno como a comunicação política, cul- tural, comercial, etc., mediatização e comunicação, ao fim e ao cabo, findarão por ser a mesma coisa. Talvez até faça sentido sustentar esta tese, mas estamos prontos para esta conversa? Um outro risco é o imperialismo epistemológico. Lembro que Umberto Eco usou exatamente esta expressão no início dos anos 1970, quando publicou o seu Trattato di semioti- ca generale , advertindo para o risco que isso representaria para a disciplina. É claro que ninguém lhe deu ouvidos e a semiótica se tornou, efetivamente, uma disciplina imperialista, avançando e anexando todos os territórios em que lhe foi possível pôr as mãos, até desaparecer, paradoxalmente, “por excesso” (mas não contem isso aos semioticistas remanescentes, que eles ainda relutam em registrar o fato). Se a mediatização for um super- conceito, dificilmente resistiria à sedução de se transformar em uma fórmula que tudo decifra, que quebra todos os códigos e invade todos os sistemas, explicando tudo melhor do que qual - quer outra alternativa. É uma hipérbole, não temam, se tivesse pretensões ou alcance imperialistas, o campo da mediação não

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