Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

Ana Paula da Rosa 170 mo, em 2020 e 2021 seguimos com rostos de crianças ganhando capas e manchetes, mas no percurso de 1984 a 2021 a fórmula de expor o rosto inquisidor ganhou outras nuances. A mutação se inicia pelo conhecimento em circulação. Isto é, em 1984 o jornalismo e, consequentemente, os meios de comunicação hegemônicos detinham um papel de sincroniza- dor social, na expressão cunhada por Harry Pross (1989). Os tempos de vida e os modos de percepção do mundo se davam com mais intensidade a partir da esfera dos meios, o que não significa dizer que não houvesse uma pujante produção de sentidos para além deles. No atual momento, os meios hegemônicos ainda possuem um importante papel na chancela dos discursos em circulação, incluindo aí as imagens. Porém, o modo de sua produção já não está mais somente nas mãos de repórteres, fo- tógrafos ou mesmo profissionais da comunicação. Assim como visto em Rosa (2020a), os conflitos na Síria resultaram em uma ampla produção de imagens feitas por atores sociais e, também, pela Syria Civil Defense, os chamados capacetes brancos. Cada resgate é acompanhado de perto, numa cobertura que tem por papel dar visibilidade aos confrontos e às discrepâncias cada vez mais intensas de um sul global. Entretanto, observamos que esse processo de conhecimento em circulação sobre a circulação das imagens está ligado diretamente à didatização das lógicas de mídia e a um crescen- te desenvolvimento de lógicas de midiatização que vão sendo aprendidas, apropriadas e instituídas. Assim, quando falamos em lógicas de midiatização, estamos nos reportando ao que Braga (2014) considera como um diferencial central das lógicas de mídia, porque estão baseadas nos fazeres sociais tentativos. Como bem aponta o autor, “todos os setores sociais desenvol- vem tentativas para se dotar dos recursos da mídia em suas interações, com uma variedade de motivações”. Tais motivações vão desde uma maior penetração na sociedade até a busca de reconhecimento. Neste aspecto, Braga (2014, p. 28) indica que lógicas de midiatização envolvem processos experimentais que podem ser percebidos quando observados em relação às lógicas de mídia. Esta tensão entre lógicas é importante aqui para que possamos compreender que o uso do rosto de crianças em situa-

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