Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

Igor Sacramento 280 discurso), mas também os fragmentos do texto em que o enunciador evoca sua própria enunciação – ethos dito”. Nessa pers- pectiva, Dittrich (2009, p. 67) lembra que “o argumento de auto- ridade não parece abarcar toda a complexidade deste universo de apresentações e representações” dos argumentos creden- ciadores. As credenciais que conformam um enunciador como digno de confiança são mobilizadas para valorizar o enunciador não só em relação ao capital cultural e científico do enunciador, mas também a tudo aquilo que não fere os valores considerados fundamentais para o enunciatário. Consideramos ser necessário incluir uma nova forma de argumentação ética: os argumentos experienciais. A expe- riência, para além da evidência, assumiu, em nossa sociedade, um lugar privilegiado de reconhecimento do valor de verdade. Sob o peso da importância dada à política de identidade e a no- ção de lugar de fala, mas anteriormente ao testemunho como índice da verdade (SARLO, 2005) ou como a verdade apresentada (OLIVEIRA, 2020), agora parecemos, como sociedade, felizes em levar a sério as afirmações de que “eu posso ter minha verdade” e “você pode ter a sua” (FUKUYAMA, 2018). Dizendo em minhas palavras, entendo que essa epistemologia do ponto de vista e a difusão implicada da noção de experiência vivida apresentam a verdade como algo que é apenas subjetivo (minha verdade, sua verdade) ou intersubjetivo (nossa verdade), mas nunca “a” ver- dade (verdade objetiva). Aliás, parece que essa “minha”, “sua” ou “nossa” verdade busca ser uma noção vicária à de verdade objetiva. Sendo assim, sem o conceito de verdade objetiva como um padrão contra o qual sustentar afirmações subjetivas e intersubjetivas de posse da verdade, então todas as afirmações de verdade podem ser tomadas pelo valor da experiência vivida, considerando cada vez menos a mediação e a autoridade do conhecimento científico. Os fatos não falam por si – e nunca isoladamente. Nar- rativas e discursos nos permitem entendê-los, identificar seu significado, e mesmo, quando são dolorosos ou desagradáveis, ser atravessados pelo trauma ou aprender a viver com eles. É por isso que muitas narrativas giram em torno do infortúnio humano, notadamente acidentes, doenças, injustiça e perda. Como dispositivos de produção de sentido, narrativas não apenas nos

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