Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

Antonio Fausto Neto 302 nova cultura na universidade, em recente e extensa reportagem publicada neste ano, um jornal europeu examina as condições de avaliação da produção da pesquisa que a universidade desenvol- ve, chamando atenção para o que chama de “efeitos deletérios” sobre a qualidade da pesquisa e a carreira dos pesquisadores. Frisa que “o artigo se tornou uma espécie de unidade monetária que foi dramaticamente desvalorizada diante da corrida forçada para publicações”. Salienta “a existência de um mal-estar maior nos meios científicos internacionais, denunciando que muitos dos profissionais de avaliação científica têm tomado consciência de perigos mortais que representa a obsessão pelos indicadores para o futuro das universidades e da pesquisa de qualidade” (LE COMITÉ DE CARTA ACADEMICA, 2020). Se, no cenário de mediação, os professores destaca- vam-se por serem mensageiros e porta-vozes, no contexto de contatos com seus estudantes, desta feita tornam-se interfaces de outras interações. Por exemplo, escrevem para revistas à procura da certificação do seu artigo, seguindo fatores biblio- métricos. Pergunta-se: como avaliar o impacto de seus achados se os processos de reconhecimento estão restritos a parâmetros e instruções fornecidos pela cultura da datificação? Fóruns de confiabilidade constituídos por colegiados são substituídos pelo monitoramento das planilhas de indexação, e os profissionais reclamam das rotinas da vida coletiva acadêmica, alegando que precisam de tempo para “cuidar da minha produção científica...”. Outros advertem que disciplinas acadêmicas estão se conver- tendo em “serviços ao cliente”, diante da pressão que é imposta pelos sistemas de avaliação dos seus resultados. Trata-se de uma realidade que desestimula a escrita de livros, especialmente os que envolvem grandes ideias, uma vez que a avaliação desta mo- dalidade de temas e de conteúdos se torna mais difícil (VERÓN, 2013, p. 26 e VERÓN, 2011). Como comentário indireto a esta problemática, na qual se destaca o papel da ingerência de instituições e dos seus métodos sobre a pesquisa universitária, além dos efeitos destes dispositivos sobre os novos formatos da produção de conheci- mento, acentua-se que esta é drenada pelos dispositivos de inteligência artificial que respondem pela produção enunciativa e mensurativa de resultados (QUIROGA, 2019).

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