Alô Alô Amazônia

Uma análise quantitativa do rei do rádio do Amapá

  • Patricia Teixeira Azevedo Wanderley Universidade Federal do Pará
  • Luciana Miranda Costa

Resumo

Introdução


 


Este trabalho procurar exibir parte da pesquisa feita para dissertação de mestrado, procurando apresentar os números obtidos por análise quantitativa do Programa Alô Alô Amazônia da Rádio Difusora de Macapá.


 Ao abordar as características do sujeito amazônico, a partir da análise de seus recados e mensagens, divulgados no programa Alô, Alô Amazônia, procuramos analisar os dados obtidos e suas características. O referencial teórico e metodológico principal traz autores como Sá Martino, Benetti, Bakhtin e Bourdieu.


Constatamos a importância do rádio para as comunidades ribeirinhas dos estados do Pará e Amapá, mesmo em tempo de efervescência das redes sociais, com ênfase para a relação estabelecida entre ouvintes e locutores. A análise quantitativa das mensagens nos mostrou também que o público feminino é o que mais envia mensagens e o público masculino o que mais recebe. Os textos chamam a atenção para as relações de parentesco que precedem seus nomes; para o rio, sua principal avenida; para malha fluvial, principal meio de transporte; e para as diferentes religiões, que fazem parte do cotidiano e dos hábitos dos ribeirinhos.


O rádio, apesar das mudanças ocorridas nos últimos anos, ainda se apresenta como principal meio de informação e interação com o mundo externo em contextos específicos, como o das comunidades apresentadas nessa pesquisa. Isso pode ser constatado também por meio dos relatos de ouvintes, como o Pastor I.C.F, morador de Ilha da Viçosa, no munícipio de Chaves, localizado na Costa do Oceano Atlântico, em frente a Ilha do Marajó. O ouvinte sai de barco de Chaves uma vez por mês para visitar seus filhos que estudam em Macapá e em depoimento para essa pesquisa relatou que não há sinal de telefone e nem internet na comunidade e que, por conta disto, é muito difícil ter outro meio de contato com os familiares e vizinhos que não o rádio.


A partir do exposto, buscamos observar e refletir como se desenvolve a relação entre o ouvinte ribeirinho e o rádio, por meio do discurso presente nas mensagens dos ouvintes, procurando entender como se estabelece essa tríade (rádio, ribeirinho, discurso) em um contexto amazônico atual. Nosso objetivo geral, portanto, é analisar a produção e veiculação das mensagens radiofônicas, observando quais características discursivas apresentam.


A pesquisa teve como ponto de partida um estudo bibliográfico sobre o rádio, sua história e sua inserção em comunidades ribeirinhas da Amazônia, além de entrevistas realizadas em Macapá, no período fevereiro de 2018 a dezembro de 2019. Foram selecionadas 117 mensagens transmitidas no programa Alô, Alô Amazônia entre os dias 01 a 15/12/2018 e em 21/12/2018.


Buscamos compreender como o programa é produzido, qual sua estrutura e percurso histórico, além de apresentar os resultados de pesquisa quantitativa produzida por este trabalho. Apresentamos os dados numéricos da análise de 117 mensagens, nos quais identificamos o gênero que mais emite mensagens e o que mais recebe, além de indicar o dia da semana com maior fluxo de mensagens, os valores monetários mais arrecadados e tipos de mensagens veiculadas.


 


O Alô, Alô Amazônia em números


 


As mensagens do programa são divulgadas mediante pagamento, com valores variáveis. Mensagens simples, com poucos caracteres custam cinco reais, se elas forem repetidas mais de uma vez, ou em outros dias, é pago o valor da mensagem multiplicado pela quantidade de inserções. Para mensagens-convite, ou seja, mensagens que avisam as comunidades sobre festas e festejos, o valor é de 15 reais, e caso o locutor precise listar essas comunidades, o valor sobe para 20 reais.


Se ultrapassar uma folha, a mensagem pode chegar a 25 reais. Aviso acima de meia página custa 15 reais e nota de falecimento ou agradecimento custa 10 reais. As mensagens possuem estruturas textuais que as fazem ser comparadas com o gênero textual da carta pessoal. Apesar de parecer antiquado associar a estrutura da mensagem com um gênero textual que há tempos era a única forma de comunicação escrita a distância, envolvendo a figura do emissor e do receptor, o aporte tecnológico digital ainda não atingiu todas as pessoas e o formato anterior continua válido e operante. Portanto, independente das novas tecnologias, essa estrutura, na qual o emissor fala para um receptor através de um canal com mensagem e assinatura, se mantém por questões culturais, de tradição e econômico.


Mas será que Cultura e tradição são capazes de manter o programa no ar? Se tomarmos como exemplo o dia 28 de agosto de 2018 e compararmos com o mesmo dia da semana dos dois anos anteriores, observamos uma queda expressiva. Em 24 de agosto de 2016, a terceira quarta-feira do mês, o programa havia recebido 4.570 mensagens até aquele dia do ano. Já no ano seguinte, 28 de agosto de 2017, o programa teve uma queda de 645 mensagens, totalizando o número de 3.925 até aquele dia. Em 2018, a perda foi ainda maior: de 1.608 mensagens para a mesma quarta-feira, 28 de agosto, em relação ao mês e ano anteriores, contabilizando apenas 2.317 mensagens. Em agosto de 2019, o programa fechou o mês com apenas 830 mensagens veiculadas, correspondendo uma queda de 64,2%.


Mas ao compararmos a quantidade total de veiculações de mensagens reproduzidas ao ano, observamos que essa queda foi minimizada nos meses posteriores nos anos de 2016 e 2017, fechando o mês com uma diferença de três mensagens negativas em relação ao ano anterior conforme gráfico 2. Pois em 2016 foram veiculadas 10.309 mensagens e em 2017, 10.306. No entanto, ao final de 2018 a queda foi muito maior, com apenas 3.14 no total, o que reresentou uma queda de 69,4%. Fato que segundo a apresentadora Janete Carvalho, se deu com o acesso às redes sociais pelas populações ribeirinhas. Mas um fator curioso ao analisar as mensagens de 2019, diz respeito ao aumento em relação a 2018, de 200%, com um total de 9.457 mensagens veiculadas até o dia 31 de dezembro. Apesar desse aumento em relação a 2018, a relação com 2016 ainda é de déficit. Analisando de forma macro os dados, eles nos fazem refletir sobre o que levou essa queda abrupta em 2018. Dentro do Amapá, o que mais relevante aconteceu em 2018 foi o processo eleitoral. Não podemos afirmar, mas é possível observar que há incongruência de informações, nas quais, mesmo a rádio afirmando o controle, percebemos que muitas mensagens não são inseridas no formato padrão, apresentando apenas as palavras “em anexo”, além de possuírem hiatos na numeração. Mas em 2019, esses números voltam a crescer e chegam a 200% de aumento, com 9.457 mensagens veiculadas. Nos quais nenhum dos entrevistados conseguem apresentar uma justificativa para esse aumento.  


 


Para a pesquisa quantitativa do programa foram utilizadas, como já mencionado, 117 mensagens. Optamos por trabalhar com os 15 primeiros dias de dezembro, fazendo um hiato até o dia 21, data de um dos programas analisados qualitativamente. Nesse sentido como afirma Martino (2018), buscamos através da coleta de dados fechados, ter uma visão panorâmica de certos aspectos da mensagem e de quem as emite. Para quantificá-las, utilizamos o Google Forms, conhecido também como Google Formulário, pelo qual produzimos um formulário que pudesse atender a questionamentos da pesquisa para utilização futura.


O primeiro quesito analisado foi a relação da quantidade de mensagens por data. Como dito anteriormente foram mapeadas as mensagens do dia 01 de dezembro ao dia 15, com um hiato até o dia 21. Foram observados a partir de então que o dia com maior número de mensagens foi o dia 21 de dezembro, uma sexta-feira, antes do período natalino. Essa data representou 14,5% do total de mensagens analisadas, seguido do dia 04 de dezembro (terça-feira) com 12%, e dos dias 12 e 14 de dezembro com 10,3% cada. O dia que apresentou menos mensagens foi o dia 15 de dezembro com apenas 1 mensagem, obtendo uma porcentagem de 0,9%. Os outros dias se mantiveram na média de 8,5% mensagens por dia, com um total de 10 mensagens diárias. Essas mensagens foram divididas também por dia da semana, dos quais a sexta-feira foi o dia com o maior índice de procura por parte dos emissores para veicularem suas mensagens, com 29,9% e a segunda, sendo o dia com menos procura, apresentando apenas 5,13%.


O terceiro e quarto quesitos analisados dizem respeito à emissão e recepção. Nesta análise gráfica, tomamos como emissor quem vai à rádio para enviar a mensagem, e receptor a quem a mensagem é destinada. Segundos os dados, o público feminino é o que mais envia mensagens, representando 44,4%, seguido do público masculino com 41%. O público não identificado corresponde a 3,4%. Mensagens direcionadas a ambos os públicos somam 5,1% e “não foi possível identificação”, 6%. A diferença entre emissão não identificada e não foi possível identificação, é que no primeiro caso não aparece nenhuma informação sobre identificação de emissão. São as situações em que a emissora informa que a mensagem encontra-se em anexo e não no padrão produzido por ela (não tivemos acesso). Já no “não foi possível identificação”, existe o nome do emissor, mas mesmo com o nome, não foi possível identificar o gênero.


Quanto às mensagens analisadas por recepção, o sexo masculino é o gênero em que as mensagens são mais destinadas, apresentando 42,7% do total de mensagens. Ele é seguido pelas mensagens enviadas para o público em geral, categorizadas como “ambos”, as quais representam 35%. Sendo que o feminino representa um total 17,1% e o não identificado e não foi possível identificação, seguindo a mesma explicação anterior, representam 2,6% cada.


Para finalizar a análise dos dados baseada em aspectos quantitativos, chegamos a verificação da população alvo dessas mensagens. Seriam moradores do entorno dos rios? Levando em consideração que no primeiro contato com o programa, percebemos uma alta audiência por populações tradicionais ribeirinhas. Nesse sentido, além dos nomes dos emissores e destinatários, o formulário da rádio também exige a localização de quem irá receber a mensagem. Chegamos, dessa forma, ao percentual de 76,1% de localizações em áreas de rio que recebem as mensagens do Alô, Alô Amazônia. Os outros 23,9% foram de localizações identificadas com o nome “outros”.


 


Conclusão


 


Ao elaborarmos nosso primeiro corpus para a produção da análise quantitativa, chegamos à conclusão de que não houve uma queda expressiva no número de mensagens dos ouvintes, se considerarmos os anos 2016 e 2017, com 0,3%. Posteriormente, ampliamos o corpus para 2018, em virtude da acessibilidade aos dados e aí identificamos uma queda drástica de 69,44%. Isso nos levou a crer que seriam necessárias mudanças significativas para que o programa permanecesse no ar no decorrer dos próximos anos. Nos últimos ajustes para a conclusão desta pesquisa, no entanto, obtivemos os dados de 2019, que apresentaram um aumento de 200% nas mensagens em relação a 2018, com um total de 9.457 mensagens veiculadas. Isso indica que os números das mensagens apresentam falhas na sequência de identificação numérica, impedindo conclusões definitivas a partir dessa base, exigindo novas checagens comparativas.


A análise quantitativa nos mostrou também que o público feminino é o que mais envia mensagens e o público masculino o que mais recebe. Ao compararmos com a análise qualitativa, percebemos, por exemplo, uma desvalorização da figura feminina por parte dos emissores de “torneios”, ao lançar premiações menores para o mesmo tipo de disputa recreativa. A pesquisa quantitativa ratificou também a importância do “rio” para esses emissores/receptores, uma vez que a maioria das mensagens cita o rio como localização ou como referência de hábitos.


 


 


Referências

 


BAKHTIN, Mikhail. A estética da criação verbal. 2.ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1997.


BENETTI, Márcia. Análise de Discurso Como Método de Pesquisa em Comunicação. In: Pesquisa em Comunicação: Metodologias e Práticas Acadêmicas. Porto Alegre. EDIPUCRS, 2016. p.235-256


BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Pierre Bourdieu. RJ: Bertrand Brasil, 1998.


MARTINO, Luís Mauro Sá. Métodos de Pesquisa em Comunicação: proetos, ideias, práticas. Petrópolis, R: Vozes, 2018.


 

Publicado
2020-10-27
Como Citar
TEIXEIRA AZEVEDO WANDERLEY, Patricia; MIRANDA COSTA, Luciana. Alô Alô Amazônia. Anais de Resumos Expandidos do Seminário Internacional de Pesquisas em Midiatização e Processos Sociais, [S.l.], v. 1, n. 4, out. 2020. ISSN 2675-4169. Disponível em: <https://midiaticom.org/anais/index.php/seminario-midiatizacao-resumos/article/view/1232>. Acesso em: 27 abr. 2024.