Museus em midiatização: exposições no Nordiska Museet
Resumo
Busca-se neste resumo refletir sobre a midiatização nas exposições do Nordiska Museet, em Estocolmo, com o apoio do aporte teórico apresentado e das observações produzidas durante visitações. Aborda-se a abrangência da midiatização ao tratar de como as exposições são pensadas em uma sociedade em condição de midiatização. Apontam-se as propostas comunicacionais utilizadas para transmitir o conteúdo das exposições. Acredita-se que a partir dos debates e vivências atuais, é possível avançar nas discussões sobre comunicação museológica. Entende-se que esta pesquisa também ampliará a discussão sobre midiatização em museus e pode trazer considerações interessantes tratando-se de uma análise de exposições suecas por um olhar o sul global.
Entendendo comunicação museológica especialmente como exposições, mediação e ações educacionais (Cury, 2005), evidencia-se que os museus sempre buscaram meios para se comunicarem com o mundo; e com o tempo absorveram novas técnologias de mídia (Drotner et al, 2019). Compreende-se que as constantes atualizações nas estratégias comunicacionais dos museus estão ligadas à profunda transformação social, permeada pelas novas formas de comunicação, o que vai ao encontro da busca por conectarem-se com seus públicos e de sua inclusão em uma sociedade profundamente ligada à comunicação digital, carecendo de atualização constante (Cury, 2005; Remelgado, 2014; Drotner et al, 2019).
Nesse contexto, parte-se de uma perspectiva da midiatização para pensar de forma relacionada o desenvolvimento da midia, da cultura e da sociedade (Hepp, 2014) e compreender como isso ocorre nos museus. Destaca-se que além da compreensão da Declaração de Caracas (1992) do museu como um meio de comunicação, alguns autores relacionam museus e midiatização, compreendendo a exposição como meio midiático, com destaque para a primeira pesquisa empírica de Verón na abordagem da midiatização, conforme Ferreira (2020). Em contraponto, ao compreender mídia como conjunto de tecnologias de comunicação com propriedades para a produção, armazenamento, reprodução e compartilhamento de signos (ferramentas de construção de significado) através do espaço e do tempo, Drotner et al. (2019, p.3) defendem que museus não são mídia, mas pouco restaria de como os conhecemos sem ela.
Ressalta-se ainda que, como outros aspectos da vida dependentes dos meios de comunicação para estabelecer a realidade pessoal e social, os museus como instituição cultural também são afetados por eles. Além da notável mudança no papel cultural e função social dos museus, principiadas na segunda metade do século XX; as adaptações que estes espaços precisam realizar para responder às condições de midiatização para sua sobrevivência, trouxeram alterações também em seus valores institucionais. (Drotner et al, 2019, p.6).
Além da digitalização dos processos administrativos, os museus estão mais integrados aos conteúdos digitais e outras práticas (como designs de exposições que convergem a mediação digital e a prática espacial) e formas de comunicação que facilitam novos tipos de intercâmbio entre este e seu público (Drotner et al., 2019, p.7). Sendo o museu uma organização inserida na sociedade, a midiatização não é apenas seu contexto, mas uma estrutura de como a vida cotidiana é conduzida (Drotner et al., 2019, p.10), colaborando para atualizar as reflexões sobre a reestruturação das práticas e relações a partir das novas tecnologias nos museus e especialmente como essa estrutura reflete nas exposições.
A presente pesquisa possuiu observações qualitativas na coleta e na análise ao buscar encontrar as propostas comunicacionais de cada exposição e marcar repetições e diferenças nos dados encontrados, além de apontar a midiatização nesse contexto. A fonte para a coleta de dados foi a própria visita ao museu, enquanto o método foi observacional da comunicação deste local, a partir de suas exposições. Durante as visitações realizadas foi percebido como mais relevante para a pesquisa, a observação, além do próprio design de exposição, das formas de comunicação envolvendo tecnologias atuais ou não. As observações foram transcritas e categorizadas a partir da perpectiva da midiatização em museus, com o apoio de Berhon et al. (2006), para compreensão de diferentes propostas a serem observadas nas exposições, como iluminação, cenografia, textos, entre outros.
A pesquisa foi organizada em três fases, iniciando por uma revisão bibliográfica e elaboração dos instrumentos de coleta. Após visita prévia, optou-se por duas exposições do Nordiska[1] que, em comparativo, acredita-se colaborarem para compreender transformações e permanências no pensar museu. Após, realizou-se a visitação às exposições para observação e coleta de dados. Para, enfim, descrever os dados e apresentar sua a análise e interpretação. Para a análise considerou-se como estava organizado o espaço, além das abordagens comunicacionais, que foram diferenciadas através de Cury (2005) entre Transmissiva, Condutivista e Interativa.
Figura 1 – Nordiska Museet
Site do Nordiska, 2024
O Nordiska Museet, fundado em 1873, dedica-se à história e cultura do povo sueco e dos países nórdicos desde o fim da idade média até a atualidade. Desde 1907 localiza-se em Djurgårdsvägen, Estocolmo (Nordiska, 2024). O museu conta com espaços para convívio e alimentação, além de oferecer programações (Nordiska, 2024) e exposições, das quais optou-se neste texto por focar na Dukade bord, mais antiga em atividade e na Nordbor, a mais recente.
Criada em 1955, a Dukade bord aborda práticas relacionadas às refeições ao longo de cinco séculos, até cerca de 1950 (Nordiska, 2024). Há cenografia, para compreensão de como e que alimentos eram servidos em diferentes situações na Suécia; e também itens utilizados nesse período. Destaca-se um cisne assado em meio a uma mesa demonstrando formas de impressionar os convidados no século XVII. Foram observados textos de apoio, acompanhados da sinalização do áudio guia, além de bonecos, para melhor contextualização da cena. Há ainda objetos organizados cronologicamente, com identificação numeral e legendas no expositor, com número do objeto. Percebeu-se iluminação direcionando o olhar do visitante para os objetos e a falta do uso de tecnologias mais digitais, indo ao encontro da data da exposição.
Figura 2 – Dukade bord
Dukade bord em 2024, a autora
Lançada em 2024, a Nordbor foca nas pessoas e vida nos países nórdicos ao longo de 500 anos (Nordiska, 2024). Em 27 ambientes, organizados cronologicamente e em quatro estações, aborda também a relação dos nórdicos com a natureza e o clima. Conta com áudio guia, mesclando narração com cenas dramatizadas, para acompanhar a visita em dispositivo próprio ou alugado no museu. Os textos também estão disponíveis para smartphone. Mostrando-se a mais interativa das exposições do Nordiska, a Nordbor traz diversos vídeos e objetos interativos, como a mesa do café, que chama atenção, fazendo o visitante tocar em uma projeção e não em uma tela, para simular a passagem de páginas de um jornal. Som ambiente acompanha a maioria das salas, enquanto a iluminação, além de focar nos objetos e textos, colabora para criar um espaço imersivo. Diferentes cores nas paredes e tetos colaboram para a compreensão de mudança de ambiente e temática abordada, além de criar uma atmosfera de imersão.
Figura 3 – Nordbor
Nordbor em 2024, a autora
Ressaltou-se a diferença entre as exposições, o que além das temáticas, resulta dos diferentes períodos de montagem. Enquanto a mais antiga, Dukade bord, apresenta de um lado a cenografia, as peças de acervo estão do outro lado da sala, com suas identificações e legendas; além disso, não há telas, som ambiente, espaço para sentar e objetos interativos. Já a Nordbor não utiliza de bonecos, mas objetos são apresentados em meio à cenografia, em ambientes bastante interativos, apresentando a história em vídeos, através da vivência de personagens; o uso de áudios e telas está até mesmo no formato de apresentar seus textos e legendas. Essa atualização mostra uma busca do museu em aproximar-se da sociedade na apresentação de seu acervo e conteúdo, trazendo para a atualidade as questões do passado.
A efetividade das propostas comunicacionais pôde ser percebida ao longo das visitações, em que se observou o uso dos áudioguias, a interatividade com as telas e até mesmo o tempo dedicado à leitura dos textos. Além destas, diferentes tecnologias midiáticas são usadas, inserindo-se na linguagem própria das exposições para transmissão e circulação de uma informação no museu. A dedicação do Nordiska em desenvolver atividades inseridas em uma visão midiatica ou até de tornar suas exposições mais interativas, tecnológicas e relacionadas ao smartphone do visitante, demonstra inclusão desse espaço em uma perspectiva mercadológica, necessitando receber mais visitantes para mostrar-se relevante aos provedores dos recursos e, assim, carecendo desenvolver atividades atrativas a públicos.
A circulação da informação ocorrida se amplia além da cadeia museu-exposição-visitante, para como o site, onde são direcionados através do Qrcode e redes sociais onde tanto o museu, como visitante compartilham mais informações, ampliam esses espaços para outros circulos e levam mais pessoas a visitarem os museus. Este fato ressalta as novas formas de comunicação entre o museu e o publico, o que afeta as próprias exposições. Esses apontamentos fizeram com que houvesse uma atenção às diversas tecnologias midiáticas utilizadas para comunicar as informações das exposições, como os descritos no quadro 1, além dos textos principais ou de apoio, legendas e Qrcodes para textos e audio guia, diponíveis em 11 linguas no museu.
Quadro 1 – Propostas Comunicacionais Nordiska
Audio guia
Cenografia
Boneco
Vídeo
Projeção
Mesa/tela Interativa
Som ambiente
Maquete
Objeto interativo
Lugar pra sentar
Dukade bord
x
x
x
x
Nordbor
x
x
maneq
X
x
x
x
x
x
x
A autora, 2024
Ambas as exposições exaltam as tradições e êxitos dos nórdicos, em uma perspectiva mais etnográfica, que ressalta seus costumes e modos de vida, mas também há salas mais narrativas na Nordbor, com personagens contando a história local. Há propostas mais digitais e imersivas na exposição mais recente, com maior estimulo visual e auditivo, evidenciando a busca em atrair o publico atual, o que é demonstrado, entre outras coisas, com o uso de um totem dedicado a fotografias digitais adequadas a redes sociais.
Entende-se que os espaços tornam-se mais imersivos e digitais conforme seu período de criação. As diferentes abordagens comunicacionais também refletem as necessidades e perspectivas de comunicação referentes à epoca de seus desenvolvimentos. A Dukade bord é mais transmissiva, sem muita abertura para que o visitante “se coloque” naquele espaço ou até condutivista, visto a inserção posterior de áudio guia em diferentes linguas e propostas para diferentes públicos, resultado de feedbacks ao museu. Já a Nordbor é Interativa, com propostas para que o visitante se sinta inserido na visita, tornando-a mais pessoal.
Observou-se ao longo do relato, que o Nordiska busca inserir novas tecnologias e novos formatos comunicacionais em suas exposições, confirmando que o aumento do uso de práticas midiáticas no cotidiano, torna necessária a inserção dessas nos museus, fator que evidencia a midiatização como uma estrutura onde a vida é conduzida (Drotner et al., 2019). Fato que resulta em uma atualização das exposições permanentes e de longa duração, tonando-as mais interativas e midiatizadas, o que se pretende analisar futuramente como ocorre no contexto brasileiro.
Referências
BERTHON, A; ULRICH, S; FREY, C. Designing exhibitions: A compendium for Architects, Designers and Museum profissionals. 2006 Birkhäuser – Publishers for Architecture, P.O. Boz
CURY, M.X. COMUNICAÇÃO MUSEOLÓGICA: UMA PERSPECTIVA TEÓRICA E METODOLÓGICA DE RECEPÇÃO. 2005. Tese de Doutorado – Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.
DROTNER, K; DZIEKAN, V; PARRY, R; SCHRØDER, K.C. Media, mediatisation and museums: A new ensemble. In: DROTNER, K, et. Al. (Org.) The Routledge Handbook of Museums, Media and Communication (pp.1-12). New York, Routledge, 2019
FERREIRA, J. G. O objeto, o método e a metodologia na pesquisa da circulação e midiatização (inferências a partir da obra Ethnographie de l’exposition). Revista FAMECOS, Porto Alegre, v.27, p.1-17, jan.-dez. 2020.
HEPP, A. As configurações comunicativas de mundos midiatizados: pesquisa da midiatização na era da “mediação de tudo”. MATRIZes, v.8, n.1, p.45-64, 2014.
ICOM. DECLARAÇÃO DE CARACAS - ICOM, 1992. Cadernos De Sociomuseologia. v.15 n.15, 1999. Disponível em: https://shre.ink/bHdS Acesso: 13 dez. 2024.
NORDISKA MUSEET. Site do Museu Nórdico. 2024. Disponível em: https://www.nordiskamuseet.se/ Acesso em 9 nov. 2024.
REMELGADO, A.P.S.L. Estratégias de Comunicação em Museus: Instrumentos de Gestão em Instituições Museológicas. 2014. Tese de Doutorado – Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto, 2014.
[1] A escolha pelo Nordiska Museet (Museu Nórdico) se dá como um recorte de uma pesquisa em curso, que analisa a comunicação de museus históricos em Estocolmo.