Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

A construção comunicacional da realidade 35 partilho. Isso cria um certo tipo já de diferencial. Diferencial marcado pela voz, pela imagem, e essa imagem será, digamos, o condutor de um novo tipo de relacionamento humano. Como disse Flusser, essa imagem vai marcar uma primeira divisão do homem e o mundo. Pelo processo da visibilidade e da teoriza- ção. Daí para a frente ocorre uma nova mudança, o que o Braga chama de instabilidade. Essa instabilidade vai provocar uma outra mudança, não só na escrita, não só na comunicação, mas tam- bém nas relações de poder, porque a Igreja Cristã vai incorporar o texto. O texto vai significar uma nova forma de poder, porque quem domina o texto, quem sabe traduzi-lo, terá agora nas mãos uma ferramenta, e essa ferramenta será um instrumento de po- der em sociedade. Este domínio da traduzibilidade vai durar até o século XVI, com a virada civilizatória que vai introduzir o pen- samento bipolar com René Descartes e sua proposta de separa- ção do corpo e alma. Há uma coincidência aí com o surgimento das tecnolo- gias de reprodutibilidade vindas da tipografia. A tipografia será uma revolução. Essa revolução vai mexer com as ideias e conceitos, alterando o quadro da política, da ciência, da religião. Mas ainda não estamos na última fase civilizatória, que vai introduzir na cultura os sistemas de gravação e reprodução que trarão um novo universo para as pessoas. E eu formulo três fases muito claras do processo civilizatório, caracterizadas em três pergun- tas: a primeira, ‘o que quer dizer isso?’, que é a fase da escrita; a segunda, então, classificando por importância, tem a pergunta: ‘que novo mundo surge agora com os aparelhos?’ Terceiro, ‘que tipo de homem está se criando no século XX e XXI?’ Então, essas três perguntas modulam essas mudanças dos tempos. Acoplada nelas, há, no século XIX, uma mudança também fundamental. Três mudanças, que são: o homem perde sua posição de privilégio na cultura; o conceito de imortalidade torna-se relativo; surge um novo mundo, uma nova realidade, que é a realidade do mundo criado pelas tecnologias, que é um segundo mundo, um mundo imaginário. Bom, entrando um pouco no texto de Braga, ele fala do conflito entre Habermas e Marcuse. Mas eu acho que não era esse o conflito principal alemão do século XX, e sim o conflito en- tre Habermas e Luhmann. Porque Luhmann traz uma outra luz

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