Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

A mentalidade métrica: a vida social em cenários midiáticos datificados 113 pequena, obviamente, não permite qualquer tipo de generalização, mas pode revelar se é possível verificar se as métricas têm um impacto sobre as mentalidades e os comportamentos. Epis- temologicamente, estávamos mais interessados no espectro do comportamento do que nos padrões mais comuns de uso. Em ou- tro trabalho, discuti algumas das experiências dos usuários de re- des sociais ao remover as métricas em termos de desorientações temporais, sociais e relacionadas a valores (BOLIN; VELKOVA, 2020), e, neste contexto, gostaria de ampliar a análise. As diversas desorientações estão expressas em entrevistas, por exemplo, no que tange à “novidade” das postagens: “A questão do tempo foi realmente muito difícil. Automaticamente, quando algo aparece no seu feed, é algo novo. Contudo, se você quisesse se aprofundar, era impossível. Foi muito difícil para mim descobrir o tempo [data] de uma postagem. Ah, e, também, eu queria verificar o aniversário de alguém e, adivinhe só! A data não era disponibilizada, então eu ficava pensando: ‘Ah, não! O que vou fazer agora?’” Este usuário expressa uma frustração que sentiu por não ser capaz de se orientar quanto ao tempo [data], devido à falta de um carimbo de data/hora em cada postagem. Como o feed de notícias do Facebook não é organizado cronologicamen- te por padrão, postagens publicadas em momentos diferentes podem aparecer numa ordem temporal randômica, e saber disso deixa os usuários confusos sobre qual post é novo e qual não é. Uma vez que as convenções sociais esperam que nos lembremos do aniversário de nossos amigos, a falta de informações exatas sobre quando isso ocorre para cada amigo bloqueia a ação e im- pede que o usuário cometa uma gafe ao enviar congratulações na data errada. A desorientação temporal também se relaciona a de- terminadas práticas valorizadas entre os usuários das redes so- ciais. O valor do que é novo, por exemplo, é o que é novidade. Nada é tão ultrapassado como o ontem, diz um ditado popular, e esta é uma prática que também está relacionada às convenções sociais sobre o valor da notícia.

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