Sapiens midiatizado: conhecimentos comunicacionais na constituição da espécie

José Luiz Braga 56 Constatamos que a humanidade desenvolveu a prudência de fazer a crítica de suas próprias experiências no mes- mo passo de suas invenções. O desenvolvimento de sistemas críticos se mostra, então, como um teste continuado nas aprendizagens sociais em curso, reduzindo a probabilidade de erros e desvios, quer estes ocorram por imprevisibilidade ou movidos por interesses menores. As ações humanas que se organizam de modo conti- nuado – e que buscam superar erros e corrigir agenciamentos pouco produtivos – dependem (como parte intrínseca de seus processos) de um desenvolvimento correlato de circuitos que se caracterizam pela observação crítica do que nesse espaço se cria e produz. Temos, assim, uma crítica literária, de cinema, das artes em geral, da culinária. A crítica da política, em uma sociedade democrática, se faz pela disponibilidade de voz equalizada para minorias e para a oposição. Uma parte relevante do jornalismo se exerce como crítica política – “toda produção cultural implica uma observação social que se manifesta em falas sobre essa pro- dução” (BRAGA, 2017, p. 25). Percebemos que um sistema crítico se caracteriza por dois aspectos constituintes. O primeiro é o de ser um processo essencialmente comunicacional, pondo em circulação na sociedade reações ao que a própria sociedade faz tentativamente. A segunda característica é a de ser um dispositivo de aprendiza- gem social. Aprendemos por nossos sistemas críticos fazendo correções de percurso e reinventando lógicas sociais. No espa- ço universitário, já desenvolvemos alguns aspectos de sistema crítico relativo aos processos da mídia. O seminário sobre midiatização em que esse tema foi debatido parece ser um bom exemplo disso. Mas nossa aprendizagem a respeito de midiati- zação depende ainda do desenvolvimento, no próprio ambiente social, de um vigoroso sistema de crítica em circuitos comuni- cacionais, midiatizados ou não. Ou, mais interessantemente, em circuitos que envolvam processos midiatizados e processos não midiatizados. A generalização de tais circuitos em todas as áreas é uma evidência de que os participantes sociais percebem que aprender o mundo – enfrentar os desafios diversos que a vida e a sociedade oferecem – implica processos tentativos, e que não

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